Vila Operária do DAE – Departamento de Águas e Esgoto -, construída há mais de 100 anos teve parte de suas casas – 10 unidades – demolidas pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), no início deste mês. Do conjunto histórico de 52 casas, agora restam apenas 42. Moradores indignados criaram um abaixo-assinado ou petição pública que, por enquanto, a de 700 s, para impedir novas destruições. Cloves Ferreira, jornalista do Jornal Tablóide de Cotia, membro do Conselho de Cultura da Cidade e Presidente do Conselho Nacional de Defesa do Cidadão, Condec , de Cotia, foi o primeiro a cobrar explicações das autoridades envolvidas no caso e dar voz ao apelo da população. Segundo ele, hoje o Ministério Público Federal instaurou inquérito para apurar as responsabilidades sobre a demolição. “A luta é dura, mas não podemos nos acovardar”, explica Cloves. “Um patrimônio arquitetônico e cultural de mais de 100 anos de história não pode virar pó”, afirma. “Vamos a luta para tombar aquela área e fazer um grande espaço de cultura e turismo para Cotia.”

A Vila Operária do DAE remonta às primeiras décadas do século XX. Construída entre 1910 e 1930 para abrigar operários, engenheiros e técnicos da Estação de Tratamento do Alto Cotia, a vila é um marco do patrimônio industrial e operário paulista, composta por 52 casas, igreja, grêmio de trabalhadores, clube social, escola, posto de enfermagem e praça central. Um núcleo vivo da história do saneamento básico no Estado de São Paulo, que ajudou a abastecer a capital com água potável durante décadas. Tanto que sobre ela foi lançado um belíssimo documentário em 2021, clamando pela restauração do patrimônio local. O documentário “Desejos de Memória – A História da Vila DAE e da Reserva Florestal do Morro Grande”, premiado pelo edital Seu Dito da Congada lançado pela Secretaria de Cultura e Lazer de Cotia com recursos da Lei Federal Aldir Blanc. O projeto foi idealizado e executado por Damaris Ferreira, Gabriela Carvalho e Vilma Cristina Noseda. Na verdade, desde 2018, moradores e apoiadores da causa lutam pela preservação da Vila, promovendo atividades culturais, inventários participativos, projetos escolares e eventos públicos.

Em julho de 2023, parte do local foi reconhecido pelo Governo Federal – o “Projeto Ecomuseu Morro Grande” ganhou o certificado de Ponto de Memória Coletivo do Ministério da Cultura, por meio da portaria nº 579 do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). A certificação reconheceu a relevância do patrimônio natural, histórico, arquitetônico, cultural e social do território do Morro Grande, e fortaleceu a luta pela preservação da Vila Operária e da Reserva Florestal.

Segundo o Ibram, o Ecomuseu desenvolveu ações de museologia social com foco na gestão participativa e no vínculo com a comunidade, contribuindo para a valorização da memória social brasileira. A conquista conferiu visibilidade e legitimidade ao projeto, possibilitando maior articulação com outras instituições culturais e favorecendo investimentos para a continuidade das ações no território.

A historiadora Cristina Soutelo destacou, à época, que o Ecomuseu teve papel fundamental no fortalecimento da identidade cultural e na mobilização social do bairro. Entre as iniciativas realizadas pelo coletivo, estiveram oficinas de educação patrimonial e ambiental, rodas de memória com antigos moradores e saraus culturais.

Sobre a demolição ela diz que é fundamental destacar que estamos falando de um núcleo residencial do início do século XX, construído pelo Estado — na época, pelo Departamento de Águas e Esgotos (DAE). “Isso já evidencia sua excepcionalidade, pois são raríssimos os exemplos de vilas operárias erguidas como uma ação direta do poder público”, explica.

“Além disso, o projeto arquitetônico das casas revela a forte influência das ideias higienistas que marcaram o período, especialmente diante das epidemias que atingiram São Paulo no final do século XIX e início do XX. Esse cuidado com o planejamento urbano e sanitário reflete uma preocupação com a saúde pública, muito presente naquele contexto”, lembra a historiadora.

“Por fim, vale ressaltar que a Vila é um dos poucos remanescentes materiais da história do abastecimento de água e do saneamento básico da cidade de São Paulo — aspectos fundamentais para compreendermos o desenvolvimento urbano e social da capital”, acrescentou.

Cristina fez todo um estudo sobre o conjunto arquitetônico e conta que no que se refere às dez casas recentemente demolidas — sendo oito destinadas aos conserveiros e duas aos engenheiros —, essas edificações e suas localizações originais evidenciavam uma lógica de ocupação diretamente relacionada à função exercida dentro da companhia. Essa organização espacial revela não apenas uma hierarquia social clara na distribuição dos imóveis, mas também um mecanismo de controle e vigilância sobre o trabalho, característico das políticas institucionais do período. Ou seja, é história que virou tijolos partidos. Sem aquelas edificações não se teria esse estudo todo registrado.

“Na verdade , todo o conjunto da Vila nos demonstra tal relação, por isso o pedido de preservação é para o conjunto da Vila na sua integra”, explica a historiadora. “Outra questão importante, é referente ao uso tanto a Vila Operária do Dae como a Reserva Florestal do Morro grande. Os órgãos responsáveis pela preservação desses bens patrimoniais — a Vila Operária e a Reserva Florestal do Morro Grande — precisam compreender que seu uso demanda cuidados específicos. Trata-se de patrimônios com fragilidades próprias, que exigem formas de apropriação respeitosas e sustentáveis. Tanto a Vila quanto a Reserva não comportam a lógica do chamado turismo de massa, pois tal modelo compromete sua integridade física, ambiental e simbólica. É fundamental pensar em estratégias de uso que priorizem a educação patrimonial, o envolvimento da comunidade local e a valorização da memória social”, alerta Cristina.

Apesar de sua importância histórica, a área nunca foi tombada oficialmente como patrimônio histórico.

Foi com o apoio da empresa Equatoriana, que a Sabesp iniciou, no dia 9 de maio, a demolição de casas históricas da antiga Vila Operária do DAE, parte fundamental da memória coletiva e do patrimônio do município. A ação vem sendo duramente criticada por moradores, pesquisadores e ativistas da cultura e da preservação ambiental.
A comunidade local acusa a Sabesp de negligência e abandono sistemático do espaço, permitindo a deterioração das construções e, agora, promovendo sua destruição com a justificativa de “risco estrutural”. Pelo menos dez casas foram demolidas nesta primeira ação, que pegou muitos de surpresa e gerou forte comoção entre antigos moradores e defensores da história local. “É um crime contra a memória da cidade. Estamos vendo parte da nossa história virar entulho, diante da omissão do poder público e da insensibilidade da Sabesp”, afirmou uma moradora.

Via assessoria de imprensa, a Sabesp, hoje uma empresa privatizada, informou que os imóveis demolidos próximos à Estação de Tratamento de Água Alto Cotia, no terreno pertencente à Companhia, apresentavam problemas estruturais e de segurança, com risco de desabamento. Segundo eles, as construções já estavam em ruínas e se tornaram um ponto de proliferação de animais peçonhentos, como escorpiões, cobras e aranhas, colocando em risco os alunos de uma escola estadual próxima.

Em nota, o IPHAN e o CONDEPHAAT, órgãos estadual e federal, responsáveis pela preservação do patrimônio informaram que tomaram conhecimento do caso por meio da denúncia publicada pelo Jornal Tabloide e afirmaram que “Estão apurando as informações para as medidas cabíveis.”

O Ministério Público de São Paulo também informou que existe um inquérito civil em andamento na promotoria de Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo, que trata da conversão da Reserva Florestal do Morro Grande em Unidade de Conservação, não desse caso das demolições especificamente. Informou ainda que foi juntado a denúncia do Jornal Tabloide para que seja analisado pela promotoria.

e você também o abaixo assinado ou petição pública que já está circulando nas redes sociais e ele reivindica:

o A reabertura do processo de tombamento da Reserva Florestal do Morro Grande, incluindo a Vila Operária no perímetro protegido;
o Ou a criação de um processo específico de tombamento da Vila como patrimônio histórico, cultural e industrial;
o A interrupção imediata das demolições até que haja avaliação adequada do valor patrimonial da área;
o E o compromisso da Prefeitura de Cotia, da SABESP, do Ministério Público e dos órgãos de patrimônio (como o CONDEPHAAT e o IPHAN) com a preservação ativa e participativa do local.

A petição pode ser ada pelo link: https://chng.it/9RvwrBnpKW

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